O termo “sáfico” tem sua origem com a poetisa Safo, nascida na Ilha de Lesbos (o que deu origem à criação da palavra “lésbica”), na Grécia Antiga. Um dos aspectos descritos minuciosamente por Safo em seus poemas era o amor entre mulheres, assim, a designação “sáfica” é utilizada por mulheres – ou pessoas alinhadas ao feminino – que se relacionam com outras mulheres.
Fonte: BBC News Brasil (2019).
Diante disso, a representatividade sáfica no universo cultural de filmes, séries, videogames e livros tem um papel crucial ao proporcionar inclusão, aceitação e identificação. Para mim, como mulher lésbica, consumir esse tipo de conteúdo foi essencial para compreender e acolher minha própria sexualidade. Partindo desse ponto, o texto irá explorar produções significativas tanto para a comunidade quanto para mim, destacando obras como Arcane, The Watermelon Woman, The Last of Us Part II, Willow e But I’m a Cheerleader, além de sugestões de livros que podem enriquecer o repertório referente à essa representatividade.
Arcane (2021-2024)
A série de 2 temporadas da Netflix apresenta as personagens Vi e Caitlyn, provenientes das cidades inimigas Zaun e Piltover, respectivamente. Apesar das situações conturbadas causadas por suas origens e desafios pessoais, o relacionamento entre as duas se desenvolve de forma cativante. Ambas demonstram força e maturidade, mesmo diante do caos que as cercam. Embora “Arcane” não tenha como foco principal o relacionamento delas, pois a narrativa da série é marcada pela rica complexidade científica, política e psicológica, ainda assim, a conexão e a química entre Vi e Caitlyn é construída de forma natural, sua relação é vista como genuína e autêntica, adicionando profundidade e apreço à trama.
The Watermelon Woman (1996)
O filme, dirigido e protagonizado por Cheryl Dunye, oferece uma abordagem com perspectiva documentária sobre a vida de uma atriz negra da década de 1930, conhecida e creditada apenas como “The Watermelon Woman” (A Mulher Melancia), porém, adiante, descobre-se seu nome verdadeiro, Fae Richards. Cheryl, que trabalha em uma videolocadora e é apaixonada por filmes antigos, encontra um dos trabalhos de Fae e decide investigar sua história com curiosidade para revelar e conhecer a identidade da atriz. A narrativa é enriquecida pelos momentos de Cheryl explorando centros de documentação, bibliotecas e cinematecas em busca de respostas, além disso, ela grava os relatos de sua pesquisa e compartilha fragmentos de sua vida pessoal, adicionando camadas de autenticidade e conexão emocional à história.
Com o duplo protagonismo negro e lésbico de Cheryl e Fae, a produção cinematográfica se destaca como uma obra inestimavelmente valiosa. O filme confronta a invisibilidade histórica de mulheres negras no cinema, ao mesmo tempo em que dá visibilidade a relacionamentos lésbicos de forma franca e fidedigna. Essa combinação de representatividade torna o filme uma contribuição poderosa e inclusiva.
Fonte: Coletivo Crítico (2022).
The Last of Us Part II (2020)
A continuação de The Last of Us Part I (2013) é um aclamado videogame cuja história se desenvolve em um mundo apocalíptico devastado pelo fungo Cordyceps. No jogo, acompanhamos a trajetória de Ellie, com 19 anos de idade, vivendo na cidade de Jackson, onde se apaixona por Dina, a ex-namorada de seu amigo. Por conseguinte, a narrativa deixa claro que há um amor puro entre elas, mas a relação entre Ellie e Dina mostra-se árdua, com nítidos obstáculos que surgem diante dos eventos trágicos e intensos do enredo, o que dificulta seriamente a continuidade do vínculo entre as duas. Além de explorar os impasses e os momentos admiráveis desse relacionamento, o jogo aborda temas profundos como vingança, lealdade, distúrbios psicológicos e perdão.
Willow (2022)
A série de fantasia da Disney é inspirada no clássico filme de 1988, “Willow – Na Terra da Magia”. Efetivamente, trata-se de uma continuação da história original, porém apresentando uma abordagem mais moderna e atualizada. A trama é relatada na cidade fictícia de Tir Asleen, onde uma aventura cheia de feitiços, mistérios e perigos tem início. Ao longo da narrativa, somos apresentados à Kit (Ruby Cruz), a princesa de Tir Asleen, e Jade (Erin Kellyman), sua melhor amiga e protetora espadachim. A dinâmica entre elas evolui de amigas para amantes (popularmente denominada de friends to lovers), agregando uma camada de beleza e carisma à história, especialmente devido à confiança inegável entre as duas. Infelizmente, a série foi cancelada após a primeira temporada, algo que, lamentavelmente, ocorre com frequência em produções que incluem casais sáficos, deixando um vazio para os fãs que ansiavam por mais do romance entre Kit e Jade, bem como da continuação referente à jornada mágica de “Willow”.
Fonte: Disney (2022).
But I’m a Cheerleader (1999)
Com o título em português “Nunca Fui Santa”, o filme de comédia e romance narra a história de Megan (Natasha Lyonne), uma popular estudante do ensino médio que namora um jogador de futebol, mas que, apesar disso, desperta a desconfiança de seus pais e amigos quanto à sua verdadeira sexualidade. Por esse motivo, seus pais decidem enviá-la para uma casa de “reorientação”. Durante sua chegada e adaptação ao local, Megan menciona de forma cômica que tira boas notas, frequenta a igreja e é líder de torcida, indicando que isso a tornaria “menos lésbica”. Contudo, após interagir com seus novos colegas, ela começa a questionar sua sexualidade e percebe que seus pais talvez não estivessem tão errados sobre ela. Embora o tema central do filme seja delicado, o desenvolvimento da história é hilário. A roteirista e diretora Jamie Babbit conseguiu abordar o assunto com uma leveza única, equilibrando humor e crítica.
Fonte: Mubi.
Recomendações de Leitura
Não somos melhores amigas – Vanessa Airallis
“Não somos melhores amigas” é um romance sáfico de época que encanta pelo enredo e temática interessantes. Ambientado em 1899, o livro traz como protagonistas Isis d’Ávila Almeida e Alice Bell Air, explorando uma narrativa fascinante e cheia de afeto. No entanto, o contexto histórico traz desafios e conflitos que impactam muitos aspectos da existência do casal.
Fonte: Amazon (2024).
Como viver para sempre – Bruna Fontes
Hanna Massoud, estudante de História da Arte, nutre uma obsessão por Emanuel Vicenzo, o mais renomado pintor de Costa Malva, conhecido por retratar uma das herdeiras da família Montserrat séculos atrás e por ter várias de suas obras desaparecidas em circunstâncias misteriosas. Apesar de inúmeros historiadores terem falhado em localizar essas peças, Hanna acredita que será diferente com ela. Para isso, precisa da ajuda de alguém que menos suporta em Costa Malva: Sabina, uma das herdeiras atuais da família Montserrat. O livro é repleto de aventuras e revelações, conduzindo o leitor por uma jornada enigmática, não apenas para desvendar os segredos dos quadros de Vicenzo, mas também para explorar a complexa relação entre Hanna e Sabina.
Fonte: Amazon (2023).
As vantagens de ser você – Ray Tavares
Ana Menezes está enfrentando uma crise profissional, frustrada com o fracasso de sua carreira como escritora e com uma vida amorosa em ruínas, resolve buscar mudanças e decide embarcar em uma viagem ao Jalapão, determinada a transformar sua realidade com os métodos “revolucionários” do coach Tony Diniz. “As vantagens de ser você” é um livro sensacional, que mistura questões psicológicas e humorísticas, além disso, nos lembra que apesar do caos inevitável da vida, é essencial encontrar força e determinação para seguir em frente e entender que as soluções dos problemas não estão perdidas.
Fonte: Amazon (2022).
A vida secreta de Isabela Esme – Lis Selwyn
Isabela Esme é uma pessoa introspectiva, que mantém muitos de seus segredos trancados dentro de si. No entanto, ao se apaixonar por Olivia, percebe que a vida é moldada por escolhas e consequências. Com essa descoberta, ela decide abraçar a liberdade de ser quem realmente é, sem esconder sua essência. O livro explora, de forma sensível, a experiência de estar “dentro do armário”, e apresenta uma perspectiva inspiradora que nos encoraja a sermos verdadeiros e fiéis a nós mesmos.
Fonte: Amazon (2021).
Desta forma, em um mundo onde a diversidade ainda enfrenta barreiras, a representatividade sáfica em meios culturais é uma força transformadora, pois essas narrativas nos lembram que a pluralidade de vozes é essencial para construir uma sociedade inclusiva, onde cada história contada é um passo em direção à visibilidade e um convite para que mais pessoas se vejam e se reconheçam.